Longevidade: como viver mais e melhor

Que as pessoas estão vivendo mais, todo mundo já sabe. A expectativa de vida do brasileiro aumentou muito nas últimas décadas: segundo o levantamento mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado em novembro de 2022, hoje vivemos em média 77 anos. E, para comparação, antes os números eram os seguintes:

  • 1940 – 45,5 anos
  • 1950 – 48 anos
  • 1960 – 52,5 anos
  • 1970 – 57,6 anos
  • 1980 – 62,5 anos
  • 1990 – 66,9 anos
  • 2000 – 69,8 anos
  • 2010 – 73,9 anos
  • 2020 – 76,8 anos

Com o aumento da longevidade, ganhamos outro desafio: viver mais e melhor! E o resultado dessa equação não depende só de “sorte”, mas também depende, e muito, das escolhas que fazemos.

Para entender melhor como ter longevidade de forma mais saudável, conversamos com a médica Kelem de Negreiros Cabral, geriatra no Hospital Sírio-Libanês, que tratou de questões de saúde física e emocional particulares da terceira idade e comentou sobre alguns estigmas associados à velhice:

“O envelhecimento não precisa ser associado a algo negativo. Ele pode, sim, ser vivido de forma plena, com sabedoria e com saúde, desde que façamos escolhas diárias na nossa vida”, afirmou.

Leia, a seguir, a entrevista com a especialista:

Quais são as principais dicas não só para viver mais, mas para uma longevidade saudável?

Nós sabemos que, na verdade, a longevidade está associada a diversos fatores genéticos, que é algo não modificável, mas que pode ser modulado pelas questões ambientais. E isso tem relação com levar um estilo de vida saudável. E quais são esses itens? Vamos lá:

Alimentação equilibrada, com uma baixa ingestão de sal, de gordura, de alimentos ultraprocessados; uma ingestão rica em frutas, legumes; um consumo reduzido de carne vermelha.

Prática regular de atividade física, ter um nível mínimo de movimentação. Claro que, se você conseguir adequar na sua rotina uma atividade física programada, em que pare e se exercite pelo menos 30 minutos diariamente, melhor! Mas caso isso não seja possível, é recomendável incluir atividade física não programada – por exemplo: trocar a escada pelo elevador, descer um ponto de ônibus antes e andar o restante a pé; estacionar o carro mais longe para andar mais. Ou seja, incluir a atividade física nas suas tarefas rotineiras.

Sono reparador é outro item relevante quando se pensa em recuperação biológica do nosso corpo. Esse é o momento em que o nosso corpo se restaura, se reequilibra. Então, é importante que durmamos, e que durmamos bem. Isso se relaciona com uma evolução cardiovascular, com menor risco de doenças cardiovasculares, demência e todos os outros benefícios associados.

Abstenção do tabaco. Não fumar também se relaciona à redução de doenças cardiovasculares, do risco de demência e de neoplasias.

Consumo reduzido/equilibrado de álcool, que também traz malefícios para a saúde.

Baixa exposição ao estresse emocional. Estresse crônico é extremamente ruim para a saúde cardiovascular e cognitiva.

Manter uma boa rede de suporte social, ter conexões sociais e vínculos afetivos com propósito, meios de convívio, seja em ambientes familiares ou não – isso é extremamente importante quando pensamos em longevidade.

Acompanhamento médico.

Quando se diz que o envelhecimento saudável e com qualidade de vida depende da atenção integral à saúde dos idosos, de que estamos falando em termos práticos?

Quando falamos em atenção integral à saúde do idoso, nos referimos a todos os aspectos envolvidos no cuidado da pessoa idosa. Isso significa que temos que olhar para questões cognitivas, de mobilidade, ambientais, sociais, emocionais.

Sabemos que a saúde da pessoa idosa sofre um impacto muito maior dessas outras condições, que vão além da questão única e exclusivamente biológica. É diferente, por exemplo, de quando falamos de um indivíduo jovem que é hipertenso e precisa tomar medicação. Muitas vezes, um indivíduo idoso, além da hipertensão, pode ter diabetes, pode ser dislipidêmico [excesso de gordura no sangue], pode ter osteoporose ou acúmulo dessas doenças crônicas não transmissíveis.

Então, precisamos estar atentos a essa questão farmacêutica, do quanto o idoso está conseguindo ingerir o medicamento e o quanto a questão ambiental é importante para a saúde dele. Por exemplo, fatores que aumentam risco de queda, as consequências para a questão do humor e da cognição. [Preciso me assegurar] se ele entende minha receita, se precisa de suporte social para comprar medicações, se precisa de ajuda para ingerir os remédios corretamente.

Quando falamos em tratamento integral à saúde do idoso, precisamos olhar todos os aspectos que envolvem o cuidado daquele indivíduo, que tem necessidades diferentes de uma população mais jovem. E cada um vai ter a sua peculiaridade, entendendo que o envelhecimento é um processo heterogêneo.

Entre as recomendações para que uma pessoa idosa viva mais e viva bem, estão aspectos como: conhecer seus direitos; acesso a medicamentos; alimentação saudável; saúde bucal; prevenção de quedas; atividade física; e sexualidade. Existe algum estudo ou conceito recente a respeito de algum desses itens?

Alimentação, saúde bucal, prevenção de queda (que é questão ambiental), atividade física (que se correlaciona com envelhecimento saudável), sexualidade (que tem relação com qualidade de vida)… Tudo é uma continuação dessa atenção integral e aspectos importantes relacionados à saúde da população idosa.

Talvez a prevenção de quedas seja, de fato, algo extremamente estudado pelo impacto individual e também na saúde pública (relacionando custos com as consequências sobre os indivíduos). Seja fratura, medo de cair, necessidade internar porque caiu… – todos esses aspectos precisam ser analisados. Sabemos que 30% dos idosos acima de 60 anos e mais de 50% daqueles com mais de 80 anos caem pelo menos uma vez. Ou seja, metade dos indivíduos acima de 80 anos vai cair pelo menos uma vez no ano. E isso pode trazer consequências drásticas para a saúde dessa população. Então, quando pensamos em promoção de envelhecimento saudável, é crucial também falarmos em prevenção de quedas. E aí entra uma discussão individual e coletiva, porque temos que pensar em modificar o ambiente, todos os controles de doenças crônicas e todas as outras condições com que esse indivíduo precisa se envolver.

Com relação à saúde emocional do idoso, que papel isso tem, do ponto de vista da geriatria, no bem-estar e na qualidade de vida?

Sabemos que as relações sociais têm um impacto profundo na saúde não só da pessoa idosa, mas na saúde e no bem-estar de pessoas de todas as idades. Isso porque o ser humano é um ser social, a unidade básica da espécie humana é a tribo. E manter conexões sociais pode enriquecer a vida de muitas maneiras. Essa necessidade de vida em comunidade é percebida de uma forma muito clara nos extremos da vida humana, a infância e a velhice. Entre os benefícios dessa conexão social, desses vínculos, podemos listar a redução do estresse e sabemos que o estresse se cola racionalmente a riscos de doenças crônicas não transmissíveis. Além disso, sabemos também que o isolamento tem efeitos negativos graves, como aumento de risco de depressão, ansiedade, demência e, inclusive, maior risco de morte. Por isso é tão importante a manutenção de conexões sociais significativas.

De um ponto de vista individual, o que se pode fazer para evitar o que se chama de “epidemia de doenças não transmissíveis”, como as doenças cardiovasculares, diabetes e câncer?

Quando falamos em prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, na verdade estamos falando das mesmas medidas que discutimos acima, sobre o envelhecimento ativo e saudável. Atividade física, vínculo social, sono reparador, alimentação equilibrada, redução de estresse, consumo moderado de álcool, tabagismo – tudo isso tem correlação com a redução de doenças crônicas não transmissíveis. Ou seja, depende do estilo de vida, das escolhas diárias que vão determinar o nosso envelhecimento.

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