Capacitismo: termos para eliminar do seu vocabulário

Capacitismo é o preconceito, a discriminação e a opressão dirigidos a pessoas com deficiência — seja física, intelectual, auditiva ou visual, por exemplo — ao associá-las à incapacidade, à inferioridade e à anormalidade. Manifesta-se por meio de comentários ou ações que, muitas vezes, podem parecer apenas piada inocente, mas não são.

A Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) cita que essas práticas dispensam às pessoas com deficiência “um tratamento sem equidade (desfavorável ou exageradamente favorável), baseando-se na crença equivocada de que elas são menos aptas às tarefas da vida comum”.

A percepção desfavorável se traduz na visão de “coitadinho” (falar com um adulto com deficiência como se ele fosse uma criança), e a exageradamente favorável se traduz na visão de “guerreiro” (tratar a pessoa como se estivesse sempre buscando superação).

Uma cartilha sobre o tema lançada pelo Governo Federal em 2021 afirma que “capacitismo não é mimimi” e lista algumas definições:

  • termos ofensivos ou pejorativos;
  • expressões inadequadas;
  • olhares de julgamento;
  • invasão de privacidade;
  • ausência de pessoas com deficiência em diversos espaços.

Exemplos de expressões capacitistas

O código de conduta da AACD tem uma lista de expressões capacitistas. Entre elas estão:

  • “Deu uma de João-sem-braço”
  • “Deu mancada”
  • “Parece retardado”
  • “Você é cego/ surdo/ mudo?” (para fazer uma reclamação)
  • “Fingiu demência”
  • “Em terra de cego, quem tem um olho é rei”

“São frases ou palavras que costumamos dizer no dia a dia e que são capacitistas. Por que não podemos usá-las? Porque elas remetem a pessoas com deficiência.”, afirma Alice Rosa Ramos, superintendente de Práticas Assistenciais da AACD.

A cartilha do Governo acrescenta que o correto é mesmo falar “pessoa com deficiência”. E indica termos que devem ser vetados, como:

  • doente;
  • defeituoso;
  • deficiente;
  • inválido;
  • aleijado;
  • especial;
  • incapaz;
  • anormal;
  • sequelado;
  • “portador de deficiência”;
  • “portador de necessidades especiais.

Frases que não devem ser ditas a pessoas com deficiência

O capacitismo também está por trás de comentários ou condutas que, a primeira vista, não parecem negativos. Na prática, estamos falando de “proteger” em excesso, “elogiar” em excesso” ou “ter dó” e expressar esse sentimento para a pessoa com deficiência.

“Um exemplo é quando pensamos ‘não vou deixar que a pessoa com deficiência faça isso porque ela não vai conseguir e, então, não vai se sentir bem’. Ou, quando temos pena, falamos ‘coitadinha, ela é dessa forma, não consegue’”, explica Alice Ramos.

Segundo a superintendente, essa postura prevê que a pessoa com deficiência deve ser tratada como diferente no ambiente de trabalho ou na escola, por exemplo.

Entre as frases que, segundo a cartilha de 2021, não devem ser ditas a pessoas com deficiência por serem consideradas capacitistas, estão:

  • “Talvez um dia você encontre alguém que lhe queira. Quem te amar de verdade não vai ver seus defeitos.”
  • “Tenha fé que você vai ser curada!”
  • “A sua vida é tão triste… você não fala… tenho tanta pena de você.”
  • “Mesmo sendo deficiente, você nunca reclama da vida! Que exemplo!”
  • “Coitada dela! Presa naquela cadeira de rodas!”
  • “Vê ele ali na cadeira de rodas? Sempre daquele jeito. Ele também não se esforça!”
  • “Na sua família só tem você de doente?”
  • “Toda vez que eu tenho um problema, eu lembro de você. Eu podia ter uma deficiência e levar uma vida como a sua. Daí eu melhoro na hora.”

Quanto à frase “Mas um dia pode ser que você melhore”, a superintendente da AACD afirma que depende da circunstância em que é mencionada. Se a pessoa com deficiência está no começo do processo de reabilitação, é importante estimulá-la a melhorar. Mas, se ela está no ambiente de trabalho e não consegue concluir uma tarefa, seria capacitismo dizer que a pessoal talvez um dia melhore.

“É o mesmo que falar: ‘Se você treinar, talvez você chegue à capacidade dos outros’. Aí, já muda de figura”, diz Ramos. “Acabamos perdendo pessoas que teriam potenciais imensos de trabalho porque as isolamos do mercado e da sociedade de forma geral.”

Que condutas não devem ser tomadas diante de pessoas com deficiência

Há pessoas que, devido a alguma alteração cerebral (por paralisia cerebral, AVC ou trauma de crânio, por exemplo), têm dificuldade de falar ou realmente não falam. E, muitas vezes, elas são equivocadamente prejulgadas, como se também tivessem alguma alteração intelectual.

“Da mesma forma, uma pessoa com uma deficiência intelectual, em muitos casos, é vista como alguém que precisa ser interditado, que não está apto para a vida civil. E isso é uma inverdade”, afirma Ramos.

Outras condutas consideradas erradas são:

  • Insistir muito em oferecer ajuda mesmo que a pessoa com deficiência recuse (e questionar essa recusa);
  • Infantilizar adultos com deficiência;
  • Usar banheiros ou vagas de garagem exclusivos para pessoas com deficiência, se não for o seu caso, mesmo que seja rápido.

A superintendente da AACD aponta ainda que não é visto como certo tratar atletas paralímpicos como se fossem super-homens e super-mulheres.

“São pessoas com deficiência que desenvolveram habilidades para o esporte, como qualquer outra pessoa desenvolveria. A exibição na TV é bacana, tira esse estigma de que pessoas com deficiência não podem fazer esportes”, explica. “Ver uma pessoa com malformação – ou mesmo com uma amputação – nadando quatro estilos é sensacional. Mas, ao mesmo tempo, elas não são super.”

Como tratar desse assunto com crianças?

É normal que crianças sem deficiência façam perguntas quando veem alguma pessoa com deficiência. Há adultos que simplesmente mandam a criança ficar quieta, o que, para especialistas, não é uma boa “saída”.

A primeira recomendação é: seja direto e sincero.

Se a pessoa com deficiência a respeito da qual a criança perguntou teve uma perna amputada, por exemplo, é preciso falar sobre o que ocorreu – se foi acidente, doença etc. E, em seguida, explique que será iniciado um tratamento até que seja possível usar uma perna substituta, se for o caso.

“Já no caso da criança com deficiência, é importante que ela esteja inserida na sociedade, para que as outras crianças possam conviver com ela, percebendo as dificuldades, as diferenças. E começa daí a se criar um respeito”, afirma Alice Ramos.

Matérias
relacionadas