Autismo: entender é o primeiro passo para desmistificar

No Dia da Conscientização sobre o Autismo, vamos falar sobre os desafios do diagnóstico, os sinais do transtorno, os tratamentos disponíveis e a importância de normativas para garantir um atendimento adequado

O Transtorno do Espectro Autista (TEA), mais conhecido como autismo, afeta uma a cada 36 crianças no mundo, de acordo com um estudo de 2020 do Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Apesar de ter características bem definidas, o diagnóstico ainda é um grande desafio e faltam diretrizes para o tratamento. Essa falta de informação leva a abordagens inadequadas, pouca visibilidade sobre o tema e impactos negativos para as pessoas no espectro.

Entender o autismo é essencial para construirmos uma sociedade mais inclusiva e engajada com políticas públicas e tratamentos adequados. Para isso, conversamos com um especialista sobre os desafios do diagnóstico e tratamento e desvendamos mitos e verdades sobre o transtorno.

O que é o autismo e quais são os sinais?

O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento, ou seja, afeta a forma como o cérebro se desenvolve. Isso significa que pessoas no espectro podem apresentar comportamentos diferentes do esperado e dificuldades em algumas áreas, como comunicação e interação social. Além disso, podem ter padrões de comportamento repetitivos e interesses bastante específicos.

O neurologista Anderson Nitsche, especialista que atua no Serviço de Neurologia do Hospital Pequeno Príncipe, explica que o diagnóstico é clínico, ou seja, é feito com base na observação do comportamento da criança e na análise de seu histórico de desenvolvimento.

“Seguimos critérios estabelecidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) e pela Classificação Internacional de Doenças (CID-11). Para ajudar na identificação das características do TEA, usamos entrevistas estruturadas, questionários padronizados e escalas de rastreamento”, explica Nitsche.

Atualmente, não existem exames de laboratório ou de imagem que confirmem o diagnóstico de autismo. No entanto, alguns testes podem ser feitos para descartar outras condições que possam estar associadas, já que pessoas no espectro têm predisposição para algumas doenças.

Outro ponto importante é que o diagnóstico não é feito apenas por médicos. Psicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais também desempenham um papel fundamental nesse processo.

Sinais do autismo

Os primeiros sinais do autismo podem aparecer logo nos primeiros meses de vida, mas costumam ficar mais evidentes entre 1 e 3 anos de idade. Alguns desses sinais incluem:

  • Dificuldade na comunicação e interação social – Pouco contato visual, não responder quando chamado pelo nome e falta de interesse em brincadeiras compartilhadas.
  • Atraso na fala ou dificuldades na linguagem – Problemas na comunicação verbal e não verbal, o que pode afetar a forma como a criança interage e compreende o mundo.
  • Comportamentos repetitivos e interesses específicos – Movimentos como balançar o corpo ou agitar as mãos (flapping), forte apego a rotinas e resistência a mudanças. Algumas crianças também desenvolvem interesses intensos em temas muito específicos.
  • Sensibilidade sensorial alterada – Reações exageradas ou reduzidas a estímulos como barulhos, texturas e cheiros, o que pode interferir na forma como a criança explora o ambiente.

Nem toda pessoa no espectro autista apresenta todos esses sinais. Mas se você notar algumas dessas características na criança pela qual é responsável, procure um especialista.

Níveis de autismo: quais são as diferenças?

O autismo é um espectro, o que significa que ele se manifesta de formas variadas, podendo ser mais leve ou mais intenso. Nitsche explica que o DSM-5 classifica o TEA em três níveis, de acordo com a necessidade de suporte.

  • TEA nível 1 (leve) – A pessoa pode ter dificuldades para interagir socialmente, interpretar ironias e lidar com mudanças de rotina. Apesar de falar bem, pode se fixar em interesses específicos e parecer “diferente” dos colegas.
  • TEA nível 2 (moderado) – Apresenta mais dificuldade na comunicação e pode ter crises quando a rotina muda. Além disso, os comportamentos repetitivos são mais evidentes,  como alinhar objetos ou repetir frases.
  • TEA nível 3 (severo) – Tem pouca ou nenhuma fala funcional e precisa de suporte constante para se comunicar e realizar atividades do dia a dia. Pode ter hipersensibilidade sensorial intensa e crises frequentes.

Os desafios do diagnóstico de autismo e do tratamento

O primeiro grande desafio para quem está no espectro é receber o diagnóstico correto. Além disso, o acesso ao tratamento ainda é limitado, pois não há diretrizes bem estabelecidas.

Uma das abordagens terapêuticas mais usadas no Brasil e no mundo é a Análise do Comportamento Aplicada (ABA). No entanto, a falta de regulamentação fez surgir cursos e formações sem base científica, o que compromete a qualidade do atendimento e pode até prejudicar os pacientes.

A falta de regras claras também gera conflitos entre planos de saúde, órgãos reguladores e associações. No final, todos saem perdendo, mas especialmente as pessoas autistas.

Outro ponto importante é que o autismo não desaparece na vida adulta. O foco das terapias e tratamentos ainda está nas crianças, e quando elas crescem, encontram enormes desafios para ingressar no mercado de trabalho. Atualmente, cerca de 85% dos adultos autistas estão desempregados no Brasil, e a falta de políticas públicas de empregabilidade é um problema urgente.

Diagnóstico tardio: como isso afeta a vida da pessoa autista?

Muitas pessoas só descobrem que são autistas na vida adulta. Isso acontece porque, no passado, havia ainda menos informações sobre o transtorno.

“É possível diagnosticar o TEA na vida adulta, mas pode ser mais desafiador. Muitas pessoas mascaram ou compensam suas dificuldades sociais, tornando o diagnóstico mais complexo”, explica o médico.

Além disso, os sintomas podem ser confundidos com outros transtornos, como ansiedade ou TDAH. Mas o ponto-chave para um diagnóstico correto é que os sinais precisam estar presentes desde a infância.

Receber um diagnóstico tardio pode trazer alívio e uma sensação de pertencimento, mas também pode gerar frustrações. Muitas pessoas passam a vida inteira sem entender suas dificuldades e, sem apoio, podem desenvolver depressão e ansiedade.

Por outro lado, saber que se está no espectro pode ajudar no autoconhecimento e permitir que a pessoa busque suporte adequado.

Mitos e verdades sobre o autismo

Para entender o autismo, também é importante desmentir informações falsas. O médico do Hospital Pequeno Príncipe destaca os mitos mais comuns:

“Autismo tem cura” – Não. O autismo não é uma doença, e sim uma condição neurológica. O que existe são intervenções para melhorar a qualidade de vida.
“Toda pessoa autista tem deficiência intelectual” – Não. O QI de pessoas autistas pode variar bastante. Algumas têm dificuldades intelectuais, enquanto outras possuem habilidades excepcionais.
“Autistas não têm emoções” – Falso. Pessoas autistas sentem emoções como qualquer outra, mas podem expressá-las de forma diferente.
“Vacinas causam autismo” – Totalmente equivocado. Essa ideia já foi desmentida por diversas pesquisas científicas.
“Autismo é causado por falta de afeto dos pais” – Não. O TEA tem origem genética e neurológica, não sendo consequência do ambiente familiar.

Gostou deste conteúdo? Então acompanhe o blog Saúde da Saúde para saber mais sobre saúde e bem-estar!

Leia também: 
Crianças e telas: qual é o limite do uso saudável de celular?

Matérias
relacionadas