Três caminhos para o fracasso

Por volta de 1,4 mil anos atrás, viveu no Reino da Nortúmbria, hoje nordeste da Inglaterra, o monge beneditino Beda. Hábil linguista e tradutor, deixou como legado importantes obras científicas, teológicas e históricas. Mas o que me impressiona é a sabedoria contida no que ele classificou como três caminhos para o fracasso: 1) não ensinar o que se sabe; 2) não praticar o que se ensina; e 3) não perguntar o que se ignora.

Venho pensando muito sobre o fracasso institucional da Saúde, segmento que representa 9,5% do PIB brasileiro e que, ainda assim, é maltratado e sufocado pela má gestão, pela inércia, pela falta de consciência. Assistimos ao corte de bilhões no orçamento da área, enquanto o índice de desemprego sobe e as pessoas perdem seus planos de saúde – uma combinação insensata e destrutiva para o País. Líderes apoderam-se de cadeiras administrativas como ponte para alcançarem objetivos pessoais, entre eles cargos políticos. E, assim, isentam-se do compromisso com o que aprendem e com o que ainda precisam aprender.

É o caso do pai de família austero, repressor e intolerante, mas que fora de casa é desprovido de valores morais e não pratica o que ensina aos filhos. O venal age da mesma forma: dentro da instituição, defende a governança corporativa, as regras claras para compra e venda de materiais e a ética. Nos bastidores, porém, desonra a própria palavra. Fala correto, mas não pratica o que diz.

Outro perfil que todos conhecemos, dentro e fora do setor, é o do arrogante. Esse é o sujeito que acredita que de tudo já viveu e aprendeu. Finge deter o conhecimento do qual todos seus pares e colegas carecem, propagando verdades, opiniões e ensinamentos definitivos. Arma-se de razão e imposição para proteger o próprio ego.

Esse tipo de atitude é uma praga que prejudica organizações em todos os mercados, mas penso em um fator que contagia particularmente – talvez exclusivamente – a dinâmica do nosso setor. É assim: hoje, o consumidor não sabe quem são as lideranças da Ford, da Hyundai ou de qualquer outra indústria automobilística. Ele quer saber de desempenho, preço, características do produto. Na Saúde, não. Muitas vezes, o líder se torna maior do que a instituição.

Por que isso é necessariamente ruim? Não é, em uma primeira instância. A liderança carismática ajuda a impulsionar o negócio. Mas, depois, pode se tornar um amortecedor do desenvolvimento e um celeiro de vaidade. Uma liderança forte e contínua não depende de uma única pessoa, e a instituição precisa caminhar com as próprias pernas.

Na Saúde, o fracasso pode impor danos dramáticos ao resultado assistencial, não só do ponto de vista da recuperação do paciente, mas do acolhimento das pessoas. Por isso, o conhecimento é nossa fortaleza. Um recurso precioso, que deve ser absorvido e compartilhado de forma consistente e responsável. Afinal, ninguém deveria envergonhar-se do que ainda tem a aprender.

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