São Paulo retira isenção do ICMS para materiais e medicamentos da saúde em meio à pandemia e a população será afetada

Hospitais privados alertam para o aumento de custos e impacto nos pacientes. A alíquota de 18% passa a valer a partir de janeiro

O estado de São Paulo decretou recentemente o fim da isenção de ICMS sobre produtos de diversos setores a partir de janeiro de 2021. Dentre os setores afetados com a determinação estão produtos médico-hospitalares, de uso obrigatório em hospitais. Diante desse cenário, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), que representa as principais instituições hospitalares de excelência do País, avaliou que a decisão do governo trará impacto significativos para o setor de saúde, tanto para os prestadores de serviço, quanto para os planos de saúde, empresas e pacientes.

Estima-se que, apenas entre os hospitais da Anahp, o ICMS de 18% aumentará os custos em cerca de R﹩ 1,3 bilhão. Com base nos dados de janeiro a outubro de 2020, essa estimativa considerou que os gastos com medicamentos representam 11% das despesas totais, os materiais 6% e as órteses, próteses e materiais especiais (OPME) 6%.

Segundo Eduardo Amaro, presidente da Anahp, a atual isenção do estado de São Paulo não é um benefício setorial, mas uma forma consagrada em muitos países de assegurar a garantia constitucional do acesso à saúde. “A Anahp não desconhece a complexidade do momento fiscal do estado de São Paulo, mas impor ao consumidor dos serviços de saúde privada o fim da isenção e o ônus de uma alíquota de 18%, no meio de uma pandemia, certamente passará para a história como uma das medidas mais injustas do ponto de vista fiscal”, afirma.

As atividades de atendimento hospitalar são também uma das maiores geradoras de empregos formais no país, mesmo durante as crises. Em 2020, em meio à pandemia de Covid-19, os hospitais geraram 64 mil vagas de janeiro a outubro, resultado 40% maior que o observado no ano anterior. Somente no estado de São Paulo, as atividades de atendimento hospitalar geraram 17 mil vagas no mesmo período, distribuídos em mais de 100 mil leitos e 950 hospitais, entre públicos e privados.

São cerca de 700 hospitais privados no estado de São Paulo, que atendem a 17 milhões de beneficiários de planos de saúde (36% do total de 47 milhões de beneficiários no Brasil) ², o que ressalta a importância do setor no cenário geral da saúde. Além disso, por possuir hospitais de referência do tratamento de diversas doenças, São Paulo recebe muitos pacientes de outros estados, o que proporciona uma importante contribuição para a sua economia.

É importante lembrar que, em 2020, os hospitais associados à Anahp foram impactados de forma significativa pela pandemia. Com o adiamento dos procedimentos eletivos, houve queda de receita e, uma vez que a maior parte dos custos são fixos, os custos e as despesas chegaram a ultrapassar as receitas, impactando a margem EBITDA, que chegou a ser negativa em abril. No acumulado de janeiro a outubro de 2020, a margem EBITDA ficou em 7,8%, uma queda significativa de 5,6 p.p. quando comparado ao mesmo período de 2019.

Diante desse cenário, os custos com materiais e medicamentos já vêm sofrendo impactos negativos, como reflexo do aumento expressivo nos preços ocorrido por conta da dificuldade no abastecimento de medicamentos e materiais demandados no tratamento de pacientes com Covid-19, assim como os dos equipamentos de proteção individual (EPIs) não só para os profissionais da linha de frente de atendimento desses pacientes, para como para as demais pessoas que trabalham e frequentam os hospitais.

Amaro ressalta que, com o aumento do ICMS, o setor de saúde sofrerá um forte impacto negativo, em um momento crítico de pandemia. “Hospitais poderão fechar, sobretudo em regiões mais carentes em que os hospitais já têm escala reduzida e situação econômico-financeira precária, diminuindo o acesso da população. A capacidade de manter empregos e realizar investimentos também será reduzida. Além disso, com o aumento no custo de acesso ao sistema privado, será inevitável repassar os gastos para os planos de saúde, empresas e pacientes, o que reduzirá a demanda”.

Nesse contexto, os consumidores mais afetados serão os de menor renda. “No sistema público o impacto pode ser ainda maior, uma vez que pode haver uma redução significativa da demanda dos serviços privados e, consequentemente, migração de pessoas para o setor público”, reforça Amaro.

Cenário alarmante

Atualmente, as despesas com saúde representam cerca de 9% do PIB do Brasil3, sendo que o setor hospitalar do País conta com mais de 500 mil leitos e mais de 6 mil hospitais4. Apenas o setor privado responde por 5% do PIB e conta com mais de 300 mil leitos e 3,5 mil hospitais.

O setor de saúde no Brasil, tanto público quanto privado, já enfrentava grandes desafios antes da pandemia de Covid-19. O Brasil possui, comparado com os países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), uma carga tributária elevada, de 32,3% do PIB. O setor de saúde da OCDE é desonerado com isenções e bases de incidência ou alíquotas reduzidas, para viabilizar a construção e efetividade da saúde como direito fundamental de todos os cidadãos.

O impacto da pandemia no serviço privado de saúde foi brutal, com queda de faturamento, sobretudo pela suspensão dos atendimentos eletivos (consultas, exames e cirurgias), pelo aumento significativo dos preços de insumos, particularmente dos EPIs, cuja utilização cresceu de maneira exponencial, maior custo financeiro com empréstimos para cobrir os déficits de caixa, necessidade de investimentos em infraestrutura e equipamentos médicos, especialmente para aumento do número de leitos de Unidade de Tratamento Intensiva (“UTI”), bem como a contratação de novos profissionais, entre outros fatores.

“É preciso diálogo e sensibilidade para conduzir esse processo. Qualquer medida que não leve em consideração a realidade que estamos vivendo, pode impactar a saúde da população e condenar milhares de pacientes”, finaliza Amaro.

 

  1. Dados extraídos do Novo Caged | Ministério do Trabalho
  2. Dados de setembro de 2020, extraídos da Agência Nacional de Saúde Suplementar.
  3. Estimativas elaboradas pela Anahp com base em dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para 2019.
  4. Dados de novembro de 2020, extraídos do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde | Ministério da Saúde.
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