De frente para o futuro


Para Alceu Alves da Silva, Presidente do Comitê Científico do 5º Conahp, o horizonte do sistema hospitalar contemplará tecnologia, automação, prevenção e um redesenho da assistência de acordo com o novo perfil dos pacientes. Mas ainda falta resolver questões do presente

“Estamos preocupados com questões de mercado, mas a grande preocupação deve ser a assistencial. Os grandes hospitais do futuro investirão fortemente em mostrar o seu poderio assistencial”. Esse é o recado de Alceu Alves da Silva, Presidente do Comitê Científico do 5º Congresso Nacional de Hospitais Privados, o Conahp.

Para ele, que também é Superintendente do Sistema de Saúde Mãe de Deus, o futuro contemplará questões como tecnologia, automação, novo perfil do paciente e prevenção, porém discussões do presente, como o modelo assistencial e de relacionamento entre os players, ainda precisam ser resolvidas para garantir o crescimento e a sustentabilidade das organizações. Saiba mais na entrevista a seguir.

Panorama: O tema do 5º CONAHP é “O hospital do futuro: o futuro dos hospitais”. Em sua opinião, é possível identificar os fatores presentes no sistema de saúde de hoje que poderão moldar esse futuro?
Alceu Alves da Silva: Sim. Existem fatores em nosso sistema de saúde atual que, embora ainda não estejam estruturados da melhor forma, certamente estarão presentes no futuro. Um deles é a prevenção. Durante muito tempo falamos de prevenção, mas na verdade os grandes sistemas de saúde sempre estiveram mais voltados ao curativo, embora a gente saiba que a prevenção é importante. Então, mais do que nunca, no futuro nós teremos um sistema que irá privilegiar a prevenção. Outro fator é o envelhecimento. As pessoas estão vivendo cada vez mais e entrando na fase de vida em que mais usam o sistema de saúde. Assim, elas precisam ser cuidadas de forma preventiva para se manterem mais saudáveis nesta fase. Se não tivermos prevenção, elas sempre viverão na alta complexidade e há tem como sustentar um sistema destes, além de também não ser justo com essas pessoas. Outro fator importante é a tecnologia [da informação]. Nós precisamos de sistemas mais atrativos, amigáveis ao acesso de serviços de saúde, e acredito que teremos avanços impressionantes. Outro ponto também ligado à tecnologia é a automação, no sentido de processos mais seguros no ambiente hospitalar e que não ocupem tanto as pessoas que estão no atendimento ao paciente. Na área industrial isto já está muito mais avançado, com sensores, por exemplo. Há também questões relacionadas ao financiamento do serviço, pois estamos começando a avançar no subfinanciamento do sistema privado. Já temos isso no setor público – que está completamente subfinanciado. Isso é uma realidade e no futuro vamos ter que encontrar soluções importantes para o subfinanciamento.

Panorama: Em sua opinião, essa mudança passa também por uma transformação na forma como os sistemas de saúde estão organizados? Como?
Alceu: No que se refere à relação entre operadoras e prestadores de serviços, temos que entender que embora tenhamos modelos de gestão diferentes na prestação de negócio, operadoras e prestadores vivem no mesmo mercado. A discussão está muito voltada ao caráter operacional e à sobrevivência, à Órteses, Próteses e Medicamentos Especiais (OPME), à glosa, à remuneração, e nós não estamos tomando uma decisão estratégica de como o nosso mercado vai crescer. Enquanto não crescer vamos ficar na queda de braço; senão cresce o mercado, ninguém se beneficia, só “tira” do outro. Temos que ter uma visão de futuro. Somente fazendo o mercado crescer vamos encontrar formas de organizar o sistema. Discutir o modelo de remuneração, pois certamente não pode ser o modelo de remuneração que privilegia o mau desempenho e sim o bom, aquele que incentiva os prestadores fazerem um bom trabalho. Hoje temos cerca de 50 milhões de beneficiários, 25% da população brasileira, e temos condições de ter 35%, 40%, mas não do jeito que está, então precisamos discutir isso. Nessa discussão está a forma de como desenvolvemos nossas atividades. Ela não vai sair da visão de um “tira do outro” e, sim, da visão mais estratégica dos players.

Panorama: O perfil populacional, com aumento de expectativa de vida e maior incidência de doenças crônicas, já é uma realidade para muitos países. Esses dois fatores influenciarão o futuro da assistência hospitalar? Como?
Alceu: Completamente. Algumas coisas eu imagino, mas outras ainda não se sabe. Já temos mais de 50% dos estados brasileiros com população idosa de mais de 10%. As pessoas estão morrendo tardiamente, pois passam a sofrer impacto de doenças crônicas, cardiovasculares e outras de prevalência tardia. Os hospitais desejam, em termos de negócio, o quadro agudo dos pacientes, mas aqueles hospitais que não investirem na prevenção vão ter que desenvolver sistemas de captação de pacientes, que passará por ambulatórios de prevenção e cuidados com as doenças crônicas. O maior país [em população] é a China, o segundo é a Índia e o terceiro são os diabéticos. Já vemos hospitais criando unidades para cuidar desses pacientes. Por outro lado, teremos hospitais com populações cada vez mais idosas internadas, que terão leitos críticos, com pacientes de alta complexidade e de longa permanência. Isso significa que o aumento da conta será considerável. Outra questão é que os hospitais precisam pensar em como vão atender o paciente idoso no futuro. É mais interessante que ele fique [no quarto] com outro idoso ou com um jovem? É preciso pesquisar. Qual tipo de profissional vamos ter que desenvolver para atender de forma mais adequada o idoso? Vamos mexer nas instalações dos hospitais? Vamos construir mais escadas? Vamos encontrar estas repostas no futuro.

Panorama: O Conahp discutirá também o perfil do novo paciente. Em sua opinião, é possível arriscar como será esse futuro consumidor dos serviços de saúde?
Alceu: Vamos ter um paciente cada vez mais exigente e informado, cada vez mais influente no processo de diagnóstico e tratamento. No penúltimo Conahp, inclusive, tivemos uma pessoa falando do engajamento do paciente no processo terapêutico. O paciente será um sujeito ativo em seu problema. Frente a casos mais graves, ele buscará uma segunda opinião. No futuro, ele estará totalmente atrelado aos recursos de saúde, isso é importantíssimo, e mais vinculado às instituições que cuidam dele. Cada vez mais o hospital vai ter que oferecer este serviço e aprender a fazer vínculos, pois quando o paciente se sentir seguro será como se a instituição fosse a extensão da casa dele. Esse é um recado muito importante para os hospitais: estamos preocupados com questões de mercado, mas a grande preocupação deve ser a assistencial. Os grandes hospitais do futuro investirão fortemente em mostrar o seu poderio assistencial.

Panorama: A revolução tecnológica tem impactado o setor de saúde de diferentes formas. Na sua opinião, qual foi a principal delas?
Alceu: Em termos de equipamentos médicos será a progressão fantástica que já estamos vendo. A minha grande preocupação é o uso da tecnologia que envolve processos, acesso e relacionamento com os clientes, pois neste quesito precisamos fazer uma grande revolução tecnológica. Temos um setor que está a reboque dessa revolução e no 5º Conahp falaremos muito disso. É a tecnologia de acesso aos resultados de exames e às informações de saúde, por exemplo, que é fundamental na relação com o cliente, com os hospitais e com os médicos. Já para os hospitais será a automação. Ela tem que chegar com força no setor hospitalar considerando três aspectos: liberando as pessoas para fazer a assistência, pois funções técnicas podem ser feitas com tecnologia e as pessoas devem se dedicar à assistência; garantindo processos de qualidade e reduzindo custos. 

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