Comunicação no ambiente hospitalar

Como integrar o corpo clínico e a equipe assistencial nas instituições?

Capa-ilust 52205Os hospitais são instituições extremamente heterogêneas no que diz respeito às rotinas, aos profissionais, ao tipo de cliente, procedimentos e processos administrativos. Há ainda as instituições de corpo clínico aberto, que lidam com médicos habituados a transitarem por diversos hospitais, com cultura e protocolos específicos. Desempenhar a comunicação em um ambiente tão plural, construindo identificação entre os profissionais e os hospitais que representam, é o desafio que as instituições enfrentam hoje.

Segundo a Joint Commission International (JCI), a efetividade da comunicação nas instituições de saúde reduz a ocorrência de erros e resulta na melhoria da segurança do paciente. É fácil entender o porquê. O exercício da profissão de quem trabalha na Saúde é sempre levado ao limite já que direta ou indiretamente os colaboradores lidam com  vidas, e um pequeno erro pode trazer graves consequências.

No dia a dia dos hospitais a comunicação é item básico e fundamental. Seja nas trocas de plantão entre equipes, nas transferências do paciente entre unidades internas ou externas, nas situações de emergências e em todos os registros do prontuário do paciente – seja ele eletrônico ou não. Assim, a comunicação se dá oralmente, textualmente, por meios remotos ou pessoalmente.

Fica evidente que exercitar a comunicação precisa e compreensiva a todos, evitando ambiguidades e outros ruídos, é fundamental para que a assistência oferecida aos pacientes seja qualificada e segura. Além disso, a comunicação também tem papel estratégico internamente. Cria sentimento de pertencimento, compromisso com resultados, metas e protocolos, espírito de equipe, entre outros fatores essenciais para a motivação de colaboradores de qualquer negócio.

No Hospital 9 de Julho, a instituição se relaciona com 2.300 colaboradores, 800 parceiros e cerca de quatro mil médicos cadastrados. É de se imaginar o volume de informação que transita pelos corredores do hospital. Por isso, o desafio da área de Comunicação está em manter todos informados sobre o que acontece no local.

Seguindo uma política de comunicação transparente com seus diversos públicos internos, o 9 de Julho elabora conteúdos informativos específicos para cada um deles. TV Indoor, Intranet, jornal impresso para colaboradores, jornal mural com periodicidade semanal, newsletters para médicos, aplicativo para dispositivos mobile e site com área restrita para médicos, além de e-mails institucionais estão entre os recursos de comunicação em uso.

O conteúdo é planejado de forma a envolver os diversos públicos da Instituição desde o início de cada projeto, sempre com periodicidade respeitada para que não haja quebra no fluxo de informações. Para assuntos mais complexos são produzidas campanhas internas para divulgação e engajamento dos diversos públicos, com frequência e periodicidade maiores, como por exemplo quando  o hospital buscava a reacreditação da instituição junto à Joint Commission International (JCI), e precisava do envolvimento de toda a equipe.

“O principal desafio é atrair a atenção desses públicos de forma contínua, uma vez que o volume de informações é cada vez maior e vindo de diversas instituições. Para isso, é preciso criar conteúdo de interesse, envolvente, respeitando a periodicidade de cada veículo, escolhendo a melhor linguagem e ferramenta de comunicação”, explica Sílvia Alves Paz, Gerente de Comunicação e Marketing do Hospital 9 de Julho.

Sílvia ressalta ainda os benefícios para o paciente que frequenta um hospital que desenvolve uma comunicação efetiva entre o corpo clínico, como o 9 de Julho. “O objetivo da comunicação interna é informar todos os colaboradores, parceiros ou médicos sobre tudo que acontece dentro da instituição, desde novos serviços para atendimento ao cliente, quanto processos, fluxos administrativos ou assistenciais. Dessa forma, todos estão preparados para atender, esclarecer e apoiar os pacientes dentro do princípio da excelência no atendimento”, completa.

Comunicação segmentada

Uma das formas mais efetivas de desenvolver uma boa comunicação nos hospitais está em formatar as mensagens para cada perfil de público. Essa é a filosofia do Hospital Sírio-Libanês (SP), que possui pouco mais de seis mil colaboradores, incluindo 238 médicos contratados em regime CLT. Soma-se a esse montante, um corpo clínico aberto composto por cerca de quatro mil médicos cadastrados.

Por conta do grande número de colaboradores e sua diversidade e características, a comunicação com o corpo clínico e  equipes multidisciplinares de assistência é trabalhada em canais próprios e direcionados, que levam em conta as peculiaridades de cada área ou profissional.

Além desses canais, a comunicação com o corpo clínico e as demais equipes envolvidas na assistência é feita por meio de reuniões realizadas periodicamente com as áreas – enfermagem, hospitalidade e outras. Os médicos, por sua vez, contam com os encontros das comissões e dos grupos de especialidades, nos quais são discutidos temas de seu interesse.

Para atender necessidades e expectativas específicas, nos últimos anos o Sírio-Libanês fez uma completa reformulação de todas as ferramentas utilizadas na comunicação, o que também incluiu a incorporação de novas tecnologias. Essa reformulação considerou as tendências e as necessidades de agilidade, atratividade visual e diálogo aberto com os públicos internos.

Para colaboradores em geral, a instituição utiliza ferramentas tradicionais como folheteria e revista impressa, mas investe também em um canal corporativo de TV , com programação customizada para três públicos diferentes: colaboradores, médicos e pacientes e acompanhantes. São 55 telas distribuídas pelo complexo hospitalar da Bela Vista e unidades Itaim e Jardins. As informações são atualizadas diariamente e, no caso do corpo clínico, as telas ficam em áreas específicas, como as salas de conforto médico.

Outro veículo de comunicação em alta no hospital é a Intranet. Com cerca de 6.500 acessos por dia, o portal interativo centraliza toda a comunicação com os colaboradores e estimula a geração de ideias entre as equipes.

“A comunicação interna é sempre um desafio para a área de serviços, especialmente para o segmento hospitalar. Os colaboradores são responsáveis pela qualidade e segurança no cuidado do paciente, pelo calor humano, atendimento personalizado, atenção e tudo o que envolve um serviço que trata com muita proximidade o seu usuário. Para isso, é essencial que os colaboradores sejam constantemente informados com muita clareza e sejam envolvidos em todos os processos, melhores práticas, iniciativas e novos procedimentos”, enfatiza Patricia Suzigan, Executiva de Marketing e Comunicação Corporativa do Hospital Sírio-Libanês. “A comunicação interna precisa garantir o entendimento da cultura da instituição e promover o engajamento das equipes com o seu propósito e desafios”, complementa.

Desafios do engajamento

O engajamento do corpo clínico é apontado como o principal desafio nas instituições de saúde. “A grande estratégia é desenvolver o compromisso e o sentimento de copropriedade. Os médicos não são mais ‘clientes’ dos hospitais. Os clientes são os pacientes, os familiares e amigos. Os médicos são parte fundamental da própria existência da instituição, são líderes da equipe multidisciplinar e, como tal, são corresponsáveis por todos os resultados”, afirma Antônio Antonietto, Gerente de Relacionamento com o Corpo Clínico do Hospital Sírio-Libanês.

O apontamento do executivo ilustra como a relação entre médicos e hospitais tem mudado nos últimos anos. O médico continua a ser a liderança técnica, o gestor da equipe, mas assume cada vez mais o papel de “comunicador” do hospital. Uma comunicação que deve estar alinhada ao conceito de humanização no atendimento, tão prezado pelas principais instituições de excelência do país. Por isso, ao atender o paciente o corpo clínico e equipe multidisciplinar devem estar engajados com os valores e cultura da instituição.

Segundo Antônio, são muitos e permanentes os desafios de engajamento do corpo clínico, como, por exemplo, o recrutamento e a fidelização de talentos, a disseminação da cultura de excelência, pioneirismo e calor humano, dentre outros. Mas há dois desafios que merecem destaque.

O primeiro é a diminuição dos custos dos cuidados com a saúde, em que é preciso contornar a lógica de que qualidade exige aumento de recursos. “Qualidade e resultado do cuidado não podem mais ser dissociados da melhoria da produtividade, da erradicação do desperdício, da eliminação do overdiagnosis e overmedicalization”, diz.

O segundo desafio é o da transparência. Entre os próprios médicos, transparência das organizações de saúde com a sociedade, das organizações de saúde com seus próprios colaboradores, parceiros, contratados, fornecedores, entre outros, além de transparência de médicos e organizações de saúde com o público e pacientes.

“Os médicos, de modo geral, não foram educados na regra da transparência. Nós precisamos romper com a cultura de contar para o paciente somente o que achamos ser adequado. Hoje, a informação é disseminada – ou pelo menos as formas de se obter a informação são disseminadas. E não há o que se possa esconder”, afirma.

Plano estratégico

Para promover o engajamento dos médicos com os interesses maiores da instituição, o Hospital Sírio-Libanês desenvolveu diversas estratégias de promoção à formação de profissionais bem capacitados e atualizados, desafiados a produzir excelência em seu trabalho e lidar com o paciente de forma realmente humana.

Entre as iniciativas estão o Fórum de Educação, um grupo multidisciplinar que pensa a capacitação dos colaboradores de forma integrada, otimizada e o mais realista possível; o modelo assistencial Cuidado Focado, que prestigia o trabalho em equipe e multidisciplinar, bem como a transparência nas informações; e os grupos especializados multidisciplinares, que atuam de forma sinérgica na construção de uma assistência moderna e eficaz.

Além disso, o hospital realiza pesquisa de engajamento a cada dois anos, e os resultados são analisados em várias perspectivas, como área profissional, setor de trabalho, etc. A cada pesquisa, pontos de atenção são estabelecidos prioritariamente e trabalhados ao longo desse período.

A partir dessa pesquisa várias melhorias já foram implantadas no hospital. Um exemplo são os programas de reconhecimento – Meu Valor, Celebra Equipe e Celebra Equipe Multi –, que têm por objetivo valorizar colaboradores e equipes envolvidos e comprometidos com a instituição. O Tempo de Casa premia os colaboradores que trabalham há 10 anos ou mais na instituição. Já o ELO reconhece o cumprimento ou superação de metas coletivas estabelecidas a cada ano.

Ganhos para o paciente

De acordo com Ivana Siqueira, Superintendente de Atendimento e Operações do Hospital Sírio-Libanês, o principal benefício para o paciente está na contribuição que a boa comunicação agrega para a qualidade da assistência, que é o objetivo fim de toda instituição de excelência.

Ela relata que o Sírio-Libanês conta com diversas ferramentas para que os objetivos almejados pela instituição estejam claros e sempre ao alcance de todos os colaboradores. A passagem de plantão, parte do cotidiano de qualquer hospital, por exemplo, segue um formato diferente por lá. Há um roteiro que garante que as principais informações – especialmente aquelas que incidirão em ações para quem começa o novo plantão – seja realizada em poucos minutos, a fim de que os pacientes continuem de forma quase ininterrupta os cuidados a beira leito, já que sabe-se que o afastamento da equipe para reuniões longas pode resultar em oportunidade de incidentes pela redução da prontidão dos colaboradores.

Outra importante ferramenta na atenção é o Pit Stop, uma parada técnica, em que a equipe multidisciplinar alinha os principais pontos referentes aos cuidados do dia. É adotado um modelo esquemático, com imãs que representam informações, garantindo privacidade aos pacientes e, ao mesmo tempo, uma visualização para toda a equipe.

Mais uma colaboração essencial para promover a boa comunicação entre pacientes e equipe assistencial parte da equipe de Hospitalidade e Internação. Eles realizam periodicamente a explicação de todos os direitos e deveres do paciente e da equipe aos colaboradores do hospital, inclusive dando exemplos e esclarecendo dúvidas.

“Acabamos de adotar um novo Código de Conduta, que está exposto em locais públicos do complexo hospitalar da Bela Vista, no prédio administrativo e nas unidades externas. O seu conteúdo apresenta os valores organizacionais de competência, desenvolvimento, humanização, integridade e respeito que orientam todos os nossos processos assistenciais. Ao deixar essa linha de ação clara, demonstramos respeito pelo colaborador, o que resulta em um ambiente de trabalho mais saudável, transparente e tolerante que reflete diretamente no atendimento oferecido aos pacientes”, ressalta Ivana.

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